terça-feira, agosto 21, 2012
Previsão do Tempo - Dias com rajadas de saudades
Previsão do tempo
De Daniel Estill para Denis Edward Estill
Hoje de manhã, fui fazer observações meteorológicas no Aterro do Flamengo com Adriana e preparei um boletim de previsão do tempo que leio agora, em primeira mão, para todos vocês.
A primeira previsão que fiz foi que o tempo, nós próximos muitos anos, vai passar.
No período, teremos momentos de grandes instabilidades, mas também de calmarias.
Nós próximos anos, haverá dias de sol, dias de chuva, e dias de sol e chuva.
Teremos muitas noites de cinema e jantar, eventuais peças de teatro, concertos no Municipal, apresentações do coral.
Teremos fases de tristeza profunda, mas elas também, vão passar. Teremos jantares em família, às vezes só um filho ou uma filha com sua mãe, às vezes, todo mundo e uma grande bagunça.
Teremos desentendimentos, novas mágoas, decepções. Teremos novos encontros e algumas possibilidades de reconciliações. Mas isso não depende do tempo, mas do que fazemos com ele.
Teremos, infelizmente, novas doenças e partidas, mas também novas chegadas. Novos filhos e netos. Novos pais querendo educar bem os seus filhos e avôs e avós empenhando-se em estragar o serviço.
Teremos passeios de barco, teremos caminhadas, teremos viagens de avião. Eventualmente, engarrafamentos enormes, que desaguarão em pistas liberadas.
A observação das nuvens sobre o Pão de Açúcar prenuncia visitas de amigos, talvez novas amizades, outras renovadas.
O voo das gaivotas informa que mesmo pessoas distantes pensam e olham por nós, mas seguem seus caminhos em liberdade.
Havia poucas maritacas hoje no Aterro, o que pode sinalizar momentos de silêncio matinal, mas que serão interrompidos pela algaravia do dia a dia, quando despertarem as maritacas.
Observei grandes massas térmicas de pessoas indo e vindo, jogando vôlei, pedalando, correndo e caminhando. Isso prenuncia dias de trabalho, de cansaço, eventuais desânimos, mas também dias de esforço e superação.
O estudo meteorológico de hoje de manhã permite-me afirmar que, nós próximos anos, teremos momentos intensos da vida acontecendo incansavelmente. Os sinais anunciam que o tempo passa e a vida vai com ele.
Sem precisar de sinais explícitos do voo dos pássaros, do movimento das árvores sob o vento, do ir e vir de pessoas e seus cães, sei que todos esses momentos serão acompanhados pela lembrança viva do olhar brilhante e da risada fácil do meu pai, que nos acompanharam até seus últimos dias, a despeito de todo o sofrimento.
Para mim, Deus é silêncio, ausência e constância. Agora, meu pai está com ele, em silêncio, ausente e constante.
Rio de Janeiro, 4 de agosto de 2012.
quinta-feira, maio 10, 2012
Dom Casmurro no teu deserto
"Não me lembra nada dele, a não ser vagamente que era alto e usava cabeleira grande; o retrato mostra uns olhos redondos, que me acompanham para todos os lados, efeito da pintura que me assombrava em pequeno. O pescoço sai de uma gravata preta de muitas voltas, a cara é toda rapada, salvo um trechozinho pegado às orelhas. O de minha mãe mostra que era linda. Contava então vinte anos, e tinha uma flor entre os dedos. No painel parece oferecer a flor ao marido. O que se lê na cara de ambos é que, se a felicidade conjugal pode ser comparada à sorte grande, eles a tiraram no bilhete comprado de sociedade.
"(...)São retratos que valem por originais. O de minha mãe, estendendo a flor ao marido, parece dizer: 'Sou toda sua , meu guapo cavalheiro(!)' O de meu pai, olhando para a gente, faz este comentário: 'Vejam como esta moça me quer...' Se padeceram moléstias, não sei, como não sei se tiveram desgostos: era criança e comecei por não ser nascido. Depois da morte dele, lembra-me que ela chorou muito; mas aqui estão os retratos de ambos, sem que o encardido do tempo lhes tirasse a primeira expressão. São como fotografias instantâneas da felicidade."Obviamente, a exaltação do matrimônio dos pais servirá de contraponto para a amargura do seu próprio, pois nada de bom há de restar de uma leitura de Machado de Assis (afinal de contas, "não tive filhos...").
Ainda assim, dona Glória era feliz e estendia uma flor ao marido, igualmente feliz, naquelas fotografias instantâneas da felicidade.
Mas aí, lembro-me da recente leitura do Miguel Sousa Tavares (no livro citado no post mais abaixo):
"(...)Dizem que as fotografias não mentem, mas essa é a maior mentira que já ouvi.
(...)Nisso, quando guardam para sempre um instante que nunca se repetirá, as fotografias não mentem -- esse instante existiu mesmo. Porém, a mentira consiste em pensar que esse instante é eterno, que dois amantes felizes e abraçados numa fotografia ficaram para sempre felizes e abraçados. É por isso que não gosto de olhar para fotografias antigas: se alguma coisa elas reflectem, não é a felicidade, mas sim a traição -- quando mais não seja, a traição do tempo, a traição daquele mesmo instante em que ali ficámos aprisionados no tempo. Suspensos e felizes, como se a felicidade se pudesse suspender carregando no botão 'pausa' no filme da vida."Traição. São tantas as formas de trair. Mais de século separa um livro do outro e aí os tenho, tão parecidos.
quarta-feira, abril 25, 2012
No teu deserto, Miguel Sousa Tavares
"(...) Com os anos, comecei a ficar obcecado em construir coisas. Coisas que durassem, que ficassem depois de mim: filhos, casas, fotografias, livros, reportagens, viagens, histórias que eu pudesse contar e partilhar com os outros. E, de cada vez que concluía uma coisa, passava a outra e assim sucessivamente, como se tentasse ultrapassar o próprio tempo. Tirando o silêncio, a solidão e o espaço, tirando o tempo gasto nisso, todo o resto do tempo que não fosse passado a construir coisas novas parecia-me um desperdício de vida. Consumia-me uma febre insana de caminhar sempre em frente, ao mesmo tempo que tentava preservar, como coisa preciosa, a memória de todos os dias felizes que tinham ficado para trás -- e onde estavam, como as folhas secas de uma rosa deixadas entre as páginas de um livro já lido, os nossos quarenta dias de deserto."Há algum povo mais triste, mais nostálgico, mais melancólico que os portugueses?
quinta-feira, abril 19, 2012
Homens invisíveis, Leonencio Nossa
"(...) Aliás, obras didáticas consideram que a contribuição do índio se limita ao uso da rede de dormir, à domesticação da mandioca e à preservação de palavras de origem tupi. Suas formas de ver e sentir o mundo, sua relação com o ambiente e seus ritos são ignorados. A maioria dos estudantes acaba vendo o índio de forma simplista, apenas como um ser do passado."Homens invisíveis, Leonêncio Nossa.
Não, não são do passado. Os conflitos que estão ocorrendo no sul da Bahia são reais e presentes, muito presentes. E não são únicos. Os jornais puxam nossos olhos para lugares distantes, para a geopolítica do Oriente Médio, mas o nosso genocídio local é bem disfarçado, nossas Faixas de Gaza são muitas, mas não as vemos, e não, não são coisa do passado. Infelizmente, a tragédia indígena brasileira chama muito mais atenção dos estrangeiros do que de nós mesmos. Eu nunca tinha ouvido falar de Sydney Possuelo, ignorante eu. Um sujeito que desperta amor ou ódio, mas que incomoda, de uma forma ou de outra. Vim saber dele por causa deste livro: The Unconquered, que estou traduzindo, e depois, por causa deste: Homens invisíveis. Ambos ótimos. Ambos relatos de uma mesma expedição, a diferença, curiosíssima, é que um foi escrito do ponto de vista de um jornalista americano, o outro, de um brasileiro. Muito interessante de comparar.
Há tempos, lia Maíra, do Darcy Ribeiro, os livros de Márcio Souza, uma coletânea de lendas indígenas do Xingu. Já tinha ouvido falar dos irmãos Villas Boas. O assunto sempre me despertou a curiosidade. Mas é isso que os índios despertam entre nós, a curiosidade por algo exótico, que já foi. Não, não, ainda são, apenas, praticamente invisíveis.
quarta-feira, abril 18, 2012
Ismael e Chopin, Miguel Sousa Tavares
"A partir daí, a minha vida mudou. Eu era um coelho que vivia na floresta, como até aí. A minha vida era a de um coelho normal, desde que acordava até que o sol se começava a pôr: eu cuidava da minha toca, procurava comida, brincava com os meus irmãos, ia até o ribeiro beber água, permanecia atento aos perigos e aos meus inimigos. Mas, a partir do final do dia, tinha uma vida que ninguém mais, em toda a floresta, tinha igual. Porque agora eu tinha a música e a música apagava tudo o resto. Como se a própria floresta deixasse de existir, quando o sr. Chopin se sentava ao piano e a sua música saía voando por entre as árvores."Ismael e Chopin, Miguel Sousa Tavares. Companhia das Letrinhas.
domingo, fevereiro 26, 2012
Humildade, humilus, humus
"(...) E o que é humildade? Humildade vem de humilus, que pelo visto provém de humus, "terra". Por acaso há humildade na terra? Aparentemente qualquer um pode fazer o que quiser dela. Cavar, revirar, plantar. Mas no fim ela engole todos os que a dominam. E fica lá, num silêncio eterno."Uma mãe que devora inexoravelmente todos os seus rebentos. Do pó ao pó.
terça-feira, janeiro 10, 2012
Os reis malditos, Maurice Druon
in O rei de ferro, Maurice Druon, tradução de Nair Lacerda, Difel. 1. volume de Os reis malditos.
É admirável pensar que Maurice Druon é também o autor de O menino do dedo verde, não?
sexta-feira, dezembro 30, 2011
quarta-feira, dezembro 28, 2011
Finais
Os livros que devoraram meu pai, Afonso Cruz, ed. LeYa.
Repare na "História", com H maiúsculo. Afonso Cruz não está chamando de ficção.
"Quando entro no apartamento, ouço o choro de um bebê."
Ainda existem aveleiras, Georges Simenon, tradução de Celina Portocarrero, ed. L&PM
Faltaria aqui, talvez, o final de Brás Cubas, uma das frases preferidas da nossa literatura:
"Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria."
Memórias póstumas de Brás Cubas, Machado de Assis, Nova Aguilar.
Os dois primeiros finais foram de livros que ganhei de Natal e me fizeram lembrar do otimismo ingênuo de Brás Cubas de achar que o legado dele seria o mesmo legado de todos e que sua não descendência hereditária poderia fazer alguma diferença sobre a marcha geral da insensatez humana.
Quanto ao livro de Simenon, foi uma releitura. Parte pelo livro em si, parte para conhecer uma tradução da Celina Portocarrero, recentemente minha professora numa oficina de tradução da Estação das Letras. Gostei da tradução e já gostava do livro, só que pensei que fosse outro. Agora estou com um problema. Achei que o Ainda existem aveleiras fosse outra história, a história de um rapaz judeu que tem questionamentos sobre a própria fé, que recebe a orientação de um rabino (que lhe explica que acreditar ou não é uma escolha semelhante à escolha de um time de futebol pelo qual você queira torcer), que se casa com uma não judia, que se converte ao judaísmo para se casar com ele. Isso é o que eu me lembro do livro, e, pensando bem, não tem nada a ver com Simenon. Coisa que li há mais de 20 anos. Talvez algum livro do Isaac Bashevis Singer, mas também não creio que seja não. E também não faço ideia de porque misturei um livro com o outro. Sei também que esse livro misterioso influenciou a minha escolha por ter fé, ou pelo menos de tentar ter, e por isso quis recuperá-lo e o inclui na minha lista de presentes de amigo oculto. So que, com o título errado, o livro errado. Tenho fé de que o encontrarei, mas, se não for uma questão de fé, que seja de esperança. Esperança de reencontrar um livro cujo título e autor eu esqueci, mas cujo conteúdo nunca me deixou. A memória da gente é uma coisa engraçada. O outro não deixa o legado de sua (nossa, diz ele, presunçoso) miséria para um filho, mas deixa suas memórias escritas para serem lidas e relidas por milhões (?) de pessoas pelos séculos dos séculos amém. (Será que é algum outro livro do Simenon? Mas porque Simenon escreveria sobre os questionamentos religiosos de um rapaz judeu? Não faz muito sentido para mim.)
segunda-feira, outubro 31, 2011
Soco ou mão estendida?
Eu me sinto nocauteado há muito tempo por uma certa literatura, um cinema, ou uma certa arte. Não me sinto bem. Não acho que o box literário seja um bom caminho de leitura para mim. Não gosto da angústia, muito menos concordo que seja algo a ser buscado. Não concordo que essa náusea existencial seja a condição final do homem. Não quero isso para mim. Estou cansado.
Existem escritores que não nos espancam, e nem por isso lhes falta vigor. Sinto isso em relação ao Ítalo Calvino, ao Herman Hesse, ao José Saramago. Aos cronópios e famas de Julio Cortázar (mas não em relação ao detestável, egoísta e desorientado Horácio Oliveira, incapaz de amar). Alguns escritores, em vez de nos socarem e tripudiarem de nossa miserável condição, acenam para nós de dentro de uma frágil piroga que chegou à terceira margem do rio. São textos que não chafurdam na escuridão de mistérios que podem simplesmente não existir. Alguns mistérios tolos, que insistimos em criar. Contra os quais insistimos em nos debater com nossa impotência. Ou que, se existem, existem e ponto. Prefiro a luta para não me deixar arrastar pelo impossível, não para mergulhar e me perder nele. Não nego o Horror, mas não o festejo. O que me deixa cada vez mais nauseado é a violência, sempre tão gratuita, mais e mais.
"A gente estava levando agora o Sorôco para a casa dele, de verdade. A gente, com ele ia até aonde ia aquela cantiga."
Existem textos que são como cantigas, que nos acompanham até o fim, que nos levam de volta para casa, de verdade. Não falseiam nossas perdas, não negam a loucura, mas, em vez de socos, nos estendem a mão.
"Profundamente, até o chão, inclinou-se Govinda diante de Sidarta, que se conservava sentado, imóvel, e cujo sorriso chamava à memória do amigo tudo quanto ele amara no curso da sua vida, tudo quanto já se lhe afigurara precioso e sagrado."
Existem textos que nos libertam.
"Quais imprevistas idades de ouro prepara, você, malgovernado, você, precursor de tesouros que custam muito caro, você, meu reino a ser conquistado, futuro..."
E neste ponto, consigo encontrar algum sentido na literatura.
sexta-feira, outubro 07, 2011
Tranströmer, o cágado de Paulo Henriques Britto e o Nobel
E quando o Nobel de Literatura vai para um poeta, traduzido para mais de 30 idiomas (mas não para o Brasil), o "
domingo, setembro 18, 2011
A massagista japonesa - Moacyr Scliar
Decisão
Um homem vai ao médico para saber o resultado do exame; chocado, ouve o veredicto: aquilo que mais temia aconteceu, o exame revelou câncer. Quanto tempo me resta, pergunta o homem, a voz trêmula. Não muito, responde o médico, penalizado mas decidido a nada ocultar: não adianta varrer a sujeira para baixo do tapete. Não refeito do golpe, o homem sai à rua. O sol brilha, as pessoas caminham apressadas, mas ele já está longe de tudo, sente-se como encerrado numa espessa redoma de vidro na qual não penetram os ruídos nem os odores. Mas o homem não se deixará abater; reagirá, é o que resolve. Já que tem pouco tepo de vida, fará as coisas que sempre teve vontade de fazer. A primeira delas: vai ao escritório onde está empregado como contador e manda o patrão, que o oprimiu durante anos, à merda. Antes que o homem se refaça da surpresa, ele sai, não sem dizer à secretária que ela é muito, muito boa, ao que ela reage admirada, mas não desagradada. Volta para casa, conta à mulher o que aconteceu. Ela chora naturalmente, pergunta o que ele pretende fazer. Nada, ele diz. Pescar. Sempre gostou de pescar, e é o que fará agora: irá para a praia, passará os dias pescando.
Nem chega a arrumar os caniços. O telefone toca: é o médico, aflito mas alegre. Trocaram os exames no laboratório, ele anuncia, você não tem câncer, é uma simples inflamação.
Uma simples inflamação: o homem deixa-se cair na cadeira, perplexo. Que fará agora? Agora que mandou o patrão longe, agora que pretendia passar os dias pescando (se possível, isto ele só pensou, acompanhado da secretária boa)? Que fará agora, pensa, aterrorizado, agora que não tem câncer?
quarta-feira, setembro 14, 2011
Desejo que não quer deixar de ser desejo
"Para alguns, o Ser, o Self, é o fim do desejo. O que mais poderíamos desejar além do "tudo"? Para outros, uma experiência de plenitude, de inteireza, em que há lugar para o outro14, é possível. Ela dá lugar a um outro desejo, desejo do Outro, que não é apenas desejo de ser desejado, mas desejo do Outro que é querido por si mesmo na sua alteridade e não como um Ser que preenche meu desejo; pelo contrário, como Ser que aviva o meu desejo, água viva que jamais sacia completamente a minha sede..." (sublinhado meu)
E a nota da tradutora:
14 No original francês: "Pour d'autres, une expérience de plénitude, d'entièreté, qui 'n'affiche pas complet' est possible". O autor procura passar a idéia de uma pessoa inteira, mas que não se apresenta como auto-satisfeita, cheia de si mesmo, sem um lugar para o outro em sim. Ele fala de alguém inteiro, mas não completo ou repleto; o "completo" só é possível graças à presença do outro (N.T.). (subl. meu)
Lembrei que encontrei essa ideia, talvez pela primeira vez, lendo Murilo Mendes, que, em algum lugar, disse que a fé, para ele, era uma fonte de inquietação, não de certezas. Acho que foi no livro de memórias A idade do serrote.
É a tal da sabedoria humilde, porque se reconhece incompleta e ignorante. É o combustível da busca, a gasolina da inquietação e, até mesmo, da angústia existencial.
Independente de crenças ou descrenças.
quinta-feira, setembro 08, 2011
A chave da memória
(...) Na manhã da segunda-feira tio Hakim continuava falando, e só interrompia a fala para rever os animais e dar uma volta no pátio da fonte, onde molhava o rosto e os cabelos; depois retornava com mais vigor, com a cabeça formigando de cenas e diálogos, como alguém que acaba de encontrar a chave da memória.
Sidarta, o jejum e a terceira margem do rio
"- E que valor têm esses conhecimentos? O jejum, por exemplo. Para que serve o jejum?Sidarta, Hermann Hesse, tradução de Herbert Caro, ed. Record.
- Para muita coisa, meu caro senhor. Para quem não tiver nada o que comer, o jejum será a coisa mais inteligente que se possa fazer. Se, por exemplo, Sidarta não houvesse aprendido a suportar o jejum, estaria obrigado a aceitar hoje mesmo um serviço qualquer, seja na tua casa, seja em outro lugar, já que a fome o forçaria a fazê-lo. Assim, porém, Sidarta pode aguardar os acontecimentos com toda calma. Não sabe o que é impaciência. Para ele não existem situações embaraçosas. Sidarta pode agüentar por muito tempo o assédio da fome e ainda rir-se dela. É para isso, meu caro senhor, que serve o jejum."
Reli Sidarta na recente viagem familiar a Minas Gerais, onde não jejuei, com toda a certeza. Não sei jejuar, tampouco pensar ou esperar como Sidarta. Sei, só de saber, não de ser mesmo, no entanto, que liberdade não é poder ter aquilo que se quer, mas simplesmente saber não querer. Não precisar, não ambicionar e, no limite, não ser. Não sei se é algo que eu queira aprender. Também desconfio que é o tipo de coisa que não se encontra na literatura. Ou se encontra? Ou se desencontra?
Ao final do livro, Sidarta toma o lugar do barqueiro, ajuda as pessoas a atravessar um rio. Ele, no entanto, já completou a travessia , na verdade, atravessou para a terceira margem do rio. O rio.
***
PS.: A conclusão de O conde de Monte Cristo:
"- Querido - disse Valentine -, o conde não acaba de nos dizer que a sabedoria humana cabe inteira em duas palavras?
trad. André Telles e Rodrigo Lacerda, ed.Zahar
E assim, três textos literários tão díspares acabam se encontrando num post de blog porque um leitor encontrou neles um significado comum. É, literatura também é encontro, além do desencontro.
sábado, agosto 27, 2011
Alexandres Dumas, mosqueteiros e Monte Cristo
Espero que venham mais.
domingo, agosto 07, 2011
Doris Lessing, Virginia Woolf e a crítica literária
Ela é uma escritora que alguns adoram odiar. É doloroso quando alguém cuja opinião você respeita profere um discurso de antipatia, ou mesmo de ódio, por Virginia Woolf. Sempre quero argumentar com essas pessoas: mas como você não consegue ver quão maravilhosa ela é... Para mim, suas duas grandes realizações são Orlando, que sempre me faz rir, um livrinho tão espirituoso, perfeito, uma preciosidade, e Passeio ao farol, que penso ser um dos melhores romances da língua inglesa. Mesmo assim, gente dotada do mais fino discernimento não consegue encontrar nada de bom a dizer. Quero protestar, afirmando que sem dúvida não se deveria dizer "os horríveis romances de Virginia Woolf", "o tolo Orlando", mas sim "eu não gosto de Virginia Woolf". Afinal, quando pessoas da mesma categoria, de discernimento equivalente, adoram ou odeiam o mesmo livro, o mínimo de modéstia, o mínimo de respeito pela notável profissão de crítico literário seria dizer: "Eu não gosto de Woolf, mas esta é apenas a minha inclinação."Destaquei o final, pois essa sempre foi a minha opinião. Não gostar de um artista é uma questão pessoal. Não reconhecer a importância, o talento, a habilidade e o que mais um artista de quem não gostamos tem de positivo, é uma questão de discernimento. Existem uns tantos escritores que já li bastante, como Raduan Nassar, por exemplo, que julgava adorar, mas que, com o tempo, descobri que me fascinava, como o grotesco às vezes nos fascina, mas de quem não gosto. Mas quem pode, honestamente, dizer que Lavoura arcaica não é um livro fascinante? Ler gente assim, como Virginia Woolf, Raduan, ou Clarice Lispector, que escrevem coisas desagradáveis, que nos incomodam, e dizer que são ruins porque nos incomodam é confundir a obra com o efeito que ela nos causa.
E no caso de um crítico literário, ou resenhista, desmerecer uma obra por não ter gostado dela sem reconhecer que isso meramente é uma questão de gosto não é uma atitude de honestidade intelectual, mas sim de preconceito. Você pode dizer por que não gostou, até mesmo por que achou ruim. Mas também pode, e deve, dizer que não gostou, apesar de ser bom. E, principalmente, aceitar simplesmente que outras pessoas gostem de coisas que você acha um lixo por que encontram lá coisas que servem a elas e não a você, ou que até mesmo enxergam qualidades que você, ou eu, não tívemos olhos para ver.
O Fábio Sombra chegou da Flip e me trouxe uns livros de presente, um deles foi esse, A casa de Carlyle e outros esboços, de Virgínia Woolf, traduzido por Carlos Tadeu Galvão. Uma coletânea organizada por David Bradshaw e publicada aqui pela Nova Fronteira, com a citada introdução de Doris Lessing. Também me trouxe dois lançamentos do Rubem Fonseca, outro autor com quem passei a implicar mas que, mais do que reconhecer o valor, reconheço que me influenciou num nível tão pessoal que extrapola até mesmo a literatura. Só questiono se essa influência foi positiva ou negativa.
sexta-feira, julho 15, 2011
Banquete dos Mendigos: "NO PRINCÍPIO ERA O VERBO: SOBRE A IMPORTÂNCIA DA PRIMEIRA FRASE..."
terça-feira, julho 12, 2011
The dream of the return
por la calma azul o en tormentas zozobrar
poco importa el modo si algún puerto espera"
Pedro Aznar, letra, Pat Metheny, música. (http://www.pedroaznar.com.ar/poesias_popUp.php?mode=3&id=505)
Não há maior desamparo do que não ter para onde voltar, ou para quem voltar. Esposa, mãe, pai, família, terra natal, amigos. Regressar, reencontrar.
Em geral, esses regressos são internos, pois os lugares se vão, as pessoas também, mas o fato é que não nos deixam, não saem de nós. Os afetos, ou as mágoas. Regressar, reencontrar, redimir e reconciliar. A busca de uma vida muitas vezes é um esforço de regresso para si mesmo.
Retomar um velho texto datilografado e revivê-lo.
sexta-feira, julho 08, 2011
Os três mosqueteiros
"Tradicionalmente, Os três mosqueteiros era um volume obrigatório na biblioteca dos meninos e adolescentes, que se fazia acompanhar por outros clássicos romances de aventura: A ilha do tesouro, Robin Hood, O Sheik, Beau Geste, Ivanhoé, Tarzan, O último dos moicanos, Vinte mil léguas submarinas (para citar apenas um Júlio Verne), Winnetou etc. De piratas caolhos, passando por homens-formiga, soldados da Legião Estrangeira e índios americanos, tudo nesses livros era ação e emoção." (pág. 13-14)Familiar, não? Desses aí que ele listou, li a maioria. Creio que todos em traduções adaptadas, muitos daquela coleção Clássicos da Literatura Juvenil, da Abril Cultural, outros tantos nas versões de bolso da antiga Edições de Ouro. Alguns resgatados em sebos, ou das prateleiras de uma biblioteca pública, como a Regional da Lagoa, onde pude encontrar praticamente todos os livros do Tarzan, jamais reeditados, muito menos retraduzidos. Aliás, se fossem relançados agora, os livros do Tarzan seriam vendidos com tarja preta e advertências de se tratar de literatura racista, muito provavelmente. Pois é, e eram mesmo. Racistas, colonialistas, imperialistas, mas absolutamente deliciosos e viciantes (o que agora virou elogio).
Para várias gerações, esses títulos foram a porta de entrada para a literatura. Existe um poema do Drummond em que ele se refere a sua leitura do Robinson Crusoé, não lembro do nome nem do livro em que está, agradeceria muito se algum leitor que se perdesse por aqui e soubesse, me ajudasse a refrescar minha memória.
Para os meninos esquisitos, que não jogavam futebol (bem, isso ainda é assim), muitos desses livros nos acompanharam na hora do recreio e em inúmeras outras horas da solidão acompanhada que os livros nos proporcionam.
Boa parte desses livros estão virando filmes, ou sendo refilmados pela enésima vez. É o caso dos Três mosqueteiros, cujo novo trailer já está passando por aí. Possivelmente, estará cheio de adaptações. O trailer já dá ideia de uma ação bem mais intensa do que em qualquer outra versão anterior. Possivelmente, a história ficará em segundo, terceiro, décimo plano. O que vale agora é muita coreografia e efeitos especiais. Bom, melhor não fazer juízos preconcebidos e esperar pelo filme. Mas desconfio que será algo muito diferente dos Três mosqueteiros que eram quatro, e que se transformavam em cinco, quando eu entrava na história. Aliás, continuavam a ser quatro, pois eu, quando os lia, me transformava imediatamente em D'Artagnan.
O fato é que esses livros não pegam mais a molecada de hoje. Perderam o espaço nas prateleiras para a nova literatura inaugurada pelo Harry Potter. Quem não gosta do HP? Eu gosto. Li tudo, vi os filmes e curti. Também curti as versões cinematográficas do Senhor dos anéis. Mas, meus filhos não leem o que eu li (e guardei, esperançosa e ingenuamente, para eles ao longo de várias décadas). Acham velho, os volumes não os atraem, a linguagem não empolga e é difícil.
Nostalgicamente, sinto mesmo saudades das tardes com a cara enfiada numa daquelas adaptações "juvenis", que, quando muito, tinham minha audiência disputada por um filme velho do Jerry Lewis ou do Elvis Presley na Sessão da Tarde. Agora, os livros compartilham a curtição juvenil com os chamados conteúdos da Internet ou da TV a cabo. Imagine só se quando eu tinha 10 anos existisse um canal de TV com desenhos 24 horas? Teria lido bem menos, com toda a certeza. Não os culpo, só lamento que coisas boas assim estejam se perdendo, substituídas por outras que não empolgam a mim, mas empolgam a eles. Sejam felizes, pois, com certeza, são bem mais "sociais" do que eu fui.
domingo, julho 03, 2011
sábado, março 12, 2011
terça-feira, junho 08, 2010
Como se ele estivesse gripado
Hoje passei a tarde com meu pai. Minha mãe teve que sair e estamos sem acompanhante.
Cheguei lá, ele tinha acabado de deitar. No meio da tarde, fui até o quarto olhar se estava tudo calmo. Ele dormia coberto por uma colcha de tricô feita pela mãe dele, minha avó. Dormia, simplesmente. Pensei que ele poderia estar apenas gripado, com febre, como tantas vezes esteve.
Quando adoecia, antes do Alzheimer, meu pai gostava de ficar quieto na cama dele, sem ninguém em cima para chateá-lo. Uma febre, ficava rouco. Ia tomando remédio, descansando, se alimentando e aí, ficava bom.
Uma das coisas que sempre volta à minha cabeça agora, quando o vejo com ar abatido, sem falar muito, é que parece que ele está apenas gripado. Fica aquela esperança iludida e tola, essas coisas que passam pela cabeça da gente. E se ele estivesse apenas gripado? Semana que vem estaria bem. Como é difícil a idéia de uma situação irreversível entrar de fato na cabeça da gente, né?
É como passar diante do prédio onde moraram os meus avôs, por anos e anos. Que coisa estranha eles não estarem mais lá. Mas a lembrança é tão viva que é como se ainda estivessem.
Engraçado que a doença do meu pai fez eu me lembrar de muitas coisas legais dele que havia enterrado debaixo das mágoas e frustrações. Hoje eu sinto uma saudade dele que nunca imaginei que sentiria. Por isso que às vezes penso que aquilo é apenas uma gripe, pois o sinto saudável e carinhoso lá do jeito dele de uma maneira muito viva dentro de mim. E isso é bom.
Em tempo, se alguém conhecer um acompanhante de confiança aqui no Rio, por favor, escreva para mim: daniel.estill @ gmail . com (é só tirar os espaços)
sexta-feira, abril 30, 2010
Embrulho para presente
Daquela visita, lembro-me de um balcão negro, na altura do meu nariz. Meu avô conversava com o homem atrás do balcão, pareciam se conhecer, mas era improvável. Meu avô não morava no Rio, vinha de longe, vinha da cidade onde eu nasci e da qual fui separado aos quatro anos de idade. Estar com ele era um pouco da minha primeira infância que voltava para essa outra infância de oito anos, tão diferente, da qual guardo poucas lembranças de felicidade. Não, não se conheciam. No entanto, tornaram-se cúmplices.
O homem do balcão me deu um presente. Preparou o embrulho ali mesmo, na minha frente. Com um papel azul, brilhante, embrulhou algo numa minúscula caixinha, do tamanho de um dedal. A caixinha não tinha peso e ele disse que eu só poderia abri-la depois de sair. Meu avô ria, quase que para si, mas dizia-me, sério, que era um presente valioso. Uma minúscula caixinha e papel brilhante azul, leve como um pedaço de vento.
Naquele dia, conheci a Biblioteca Nacional. Seus mármores, arquivos, escadas. A impressionante sala de leitura com suas colunas altíssimas e mesas de estudo enfileiradas. Não me oprimia, me sentia bem lá. Aliás, eu me sentia bem em qualquer lugar em que estivesse com meu avô.
Finalmente, saímos. Descemos a escadaria na avenida Rio Branco, caminhamos até o ponto de ônibus. Eu, naturalmente, estava ansioso. Tinha oito anos e meu avô acabara de me mostrar uma parte do mundo que se tornaria parte de mim para sempre. Então, desfiz o embrulho, um origami, uma dobradura fechada em torno do nada. O presente era vazio. Entendi que era uma brincadeira, achei graça, apesar do desapontamento. Afinal, o que poderia caber numa caixinha daquele tamanho que pudesse ter qualquer valor? Meu avô talvez soubesse. O homem do balcão também. Deram-me um presente vazio.
Ao longo dos anos, fui preenchendo aquele pequeno embrulho. Acho que todos os livros que eu li estão lá. Estão guardados, numa caixinha vazia, cheia de histórias e de lembranças de meu avô e de um passeio pelo centro do Rio quando eu tinha oito anos, uma infância que pode não ter sido das mais felizes, mas foi repleta de significados que ainda se revelam novos, tanto tempo depois.
domingo, fevereiro 22, 2009
José Saramago responde a Juan Arias
"— Nunca lhe aconteceu de parar e pensar que afirmou algo que podia ser o contrário?
—Digo-o de outra forma: há que se parar e perguntar-se o que se está a dizer. Se o fizermos, veremos que não temos outro remédio se não analisar o que se diz, e então percebemos que às vezes dizemos coisas que não têm o menor sentido.
— Ou que às vezes o dizemos porque outros o disseram, sem refletir sobre isso.
—É, e repetimos coisas que de uma forma passiva se instilaram dentro de nós e nos impregnaram. Estou a dizer coisas que não saõ minhas. Certo, mas, na verdade, que coisas são minhas? Por isso digo que somos feitos de papel. O que é verdadeiramente nosso? Muito pouco, quase nada. Talvez todos sejamos os outros.
—É o que dizia Leonardo Sciascia, nosso querido amigo e escritor siciliano, já falecido: no fundo nunca se escreve nada de novo, mas se reescreve.
— O que não sabemos é desde quando. Realmente, das frases dos literatos se aprende muito. Diante dessa frase de Sciascia, um escritor que sempre admirei muitíssimo, surge-nos a questão: e desde quando nos reescrevemos? Porque deve ter havido um momento em que tudo era novo, e depois disso nada mais é novo, estamos a repetir tudo. Nunca sabemos quando o novo principia."
in: José Saramago: o amor possível. Juan Arias. Ed. Manati.
E aí, me pergunto. Quando e por que escrever, em lugar de ler desenfreadamente? Ou mesmo falar, em lugar de ouvir atentamente? Quem sabe se nos calarmos não consigamos aprender alguma coisa de fato e paremos de nos repetir?
quarta-feira, julho 02, 2008
O inusitado
"Lu Hsin, sentado a la cabecera de la mesa, ante el silencio absorto de los invitados, se llevó a los labios una tacita de té... azul. Tomó un sorbo de té azul, respiró, y tomó otro. Terminó la tacita de un sorbo más, y volvió a llenarla com el té azul de una tetera blanca de porcelana traslucida, llena hasta la mitad. Cada uno de los invitados, cinco graves señores mayores, estava sentado frente a una taciyta idéntica a la del anfitrión, llenas asimismo de té azul. Habían obsrvado atentamente a Lu Hsin, aun sin parecer que lo hacían. Como si salieran de un sueño, o dentro de é adquirieran movimiento, alzaro todos a un tiempo la mano derecha, tomaron sus tacitas, y se las llevaron a los labios. Un sorbo, en el silencio perfecto: cinco sorbos. Lo degustaron, pensativos. Reinaba la impresión de que a ellos no se los podrían engañar, no digamos con té chasco, per ni siquiera con um buen colorante puesto en la infusión. Y a pesar de esa certeza, estaban en trance de comprobar una verdad inverosímil. Vaciaron las tacitas confirmando um juicio. Las devolvieron a la mesa con ruiditos secos, espaciados: la música secundaria del té.
— Es té, indudablemente — dijo uno de ellos. Los otros asintieron.
Se sucedieron entonces las congratulaciones a Lu, teñidas de disculpa, como se dijeran que había sido un trámite burocrático más.
Los cinco ancianos, reconocidos expertos en arte, habían sido jurados en un concurso de pintura com té, de los que son tradicionales en nuestro país. Con las distintas variedades de té, aplicadas con pincel sobre los papeles clásicos de los acuarelistas, se obtienen exquisitas coloraciones pardo gresáceas, doradas, amarillas, ocres en todas sus tonalidades, anaranjadas, y hasta un tenue rojo. Pero, nunca azul; de ese color no había antecedentes em los cuantiosos anales de la pintura com té. Todos los colores de un bosque en otoño, pero no el cielo que se alza encima de las copas de los árboles. Todos los colores de un crepúsculo, pero no el que está antes de las transformaciones. Sin embargo, en este concurso se haía presentado una obra íntegramente pintada en azul, en lo más diversos matices del azul, desde el profundo y opaco en el que viven los pulpos, hasta el aéreo y lavado com blanco, en el que flotan nas nubecillas del mediodía. Las obras se juzgabán únicamente por sus valores pictóricos; hacerlo de otro modo habría segnificado rebararse a un nivel artesanal, o de mera curiosidad o hobby. El cuadro azul había superado a los demás presentados, por su inspiración y su destreza técnica; era el mejor, pero ¿era té? Su autor, que no era otro que Lu Hsin, había debido invitar a los jurados a probarlo en su casa. Ahora, el final requisito había sido satisfecho. Bebieron su té, y todos en paz."
Una novela china, César Aira. Ed. Contemporánea.
terça-feira, julho 01, 2008
Estranhos mundos superpostos
"[...] Basta dizer que, em algum ponto do tempo, eu me erguerei sobre você com toda a cordialidade possível. Sua alma estará em meus braços. Haverá uma cor pousada em meu ombro. E levarei você embora gentilmente."Fala o narrador, logo nos primeiros parágrafos:
De A menina que roubava livros, Marcus Zusak. Tradução de Vera Ribeiro. Ed. Intrínseca. ©2006
"¿Qué ocurre cuando una vida se desvanece? Quizás otro color desciende sobre el mundo, y se agrega a la gran suma imperfecta y fluctuante."Literatura é influência. E, como eu disse antes, existem outras realidades, a ficção se comunica ao longo de um mundo plano e horizontal, percorrido por leitores. Caso contrário, como dois escritores tão distantes e díspares fariam a mesma associação entre morte e cor? Combinadas as palavras, temos corte.
De Una novela china, César Aira. Ed. Contemporánea. ©1987
quinta-feira, junho 26, 2008
Dos começos
Ia dizer inesquecíveis, mas podem me acusar de plágio ou falta de originalidade, a causa do Sérgio Rodrigues e seu Todoprosa. Mas, é verdade, sempre apreciei bons começos, praticamente definem o andamento de todo o resto da leitura.
Dois deles ficaram gravados na memória, o que é difícil, raríssimo, uma vez que minha memória. Bem.
“Encontraria la Maga?”, de O jogo da amarelinha, e “In a whole in the ground, there lived a hobbit”, de O hobbit.
Quando fui a Paris com a esposa, pedi que ela esperasse de um lado da Pont Neuf, eu iria até o outro, depois voltaria e nos encontraríamos no meio. Ela nada entendeu, a minha Maga, que quase nada tem de cronópio e muito de fama. Ah, os papéis que atribuímos a nossas mulheres sem que elas nada saibam...
Pode parecer esdrúxulo misturar Cortazar e Tolkien. Para mim, não. Ambos são, ao fim e ao cabo, literatura de viagem. Adoro Tolkien, adoro suas intermináveis descrições das paisagens da Terra Média, um mundo com uma proporção de realidade que chega ser difícil acreditar que não é de carne e osso, pau e pedra e pó, e nunca mais. E esse começo de O hobbit, bem era um ser minúsculo que um dia botou os pés para fora de seu buraquinho no chão e se perdeu, depois se achou, mas aí já estava irremediavelmente perdido. Horácio Oliveira também era um ser minúsculo, ainda assim nunca coube em seu buraquinho original e teve que sair. Não voltou mais. Quando voltou, não se achou. Irremediavelmente estrangeiro de si. Lamentavelmente, perdeu-se de sua Maga também. Talvez, Rayuella pudesse ter começado assim: "Perderia la Maga?". Sim, perderia. E isso me causa uma profunda tristeza, pois sei bem a importância de encontrarmos a nossa Maga e a mantermos do nosso lado. Por menos Maga que seja. "Matem o cachorro!", gritava Oliveira no final. É, matem o cachorro.
sexta-feira, fevereiro 15, 2008
Tradição oral
Após botar as crianças na cama, o pequeno leitor a contragosto ao final de cada capítulo, eu e a esposa leitora nos metemos com o primeiro Espinosa, do Luis Alfredo Garcia-Roza.
Fora isso, terminei de ler Fantasma, do José Castello, que aliás anda sumido. Gostei muito, muito mesmo. Um humor ótimo, ainda que ácido, com toques de amargo, que acho que ele devia transpor para seus artigos por aí. Literatura também é diversão, ainda que ele toque em algumas coisas bem delicadas. Talvez ainda escreva mais longamente sobre esse livro.
E agora, comecei a ler o Dois irmãos, do Milton Hatoum. Estou gostando, principalmente por conhecer um aspecto de Manaus diferente, mais urbano e menos floresta tropical. E a história parece ter a força passional libanesa visível no Lavoura arcaica, do Raduan Nassar, por exemplo. Amores e ódios extremos e absolutos. Parece ser mais uma versão do velho embate de Caim e Abel, Esaú e Jacó...
segunda-feira, janeiro 28, 2008
Parménides, César Aira
1
Ésta es la historia triste del escritor Perinola, que vivió acomienzos del siglo quinto antes de Cristo en una colonia griega dela costa italiana del sur. Cuando empezó la historia, aunque ya estaba empezando a dejar de ser joven, era un escirtor joven, una"promesa" como suele decirse; no había gran cosa en la que basar la promesa, pero con poco alcanza, y hasta con nada, si lo que se promete es algo tan iverificabel com la poesía. En realidade no había escrito casi nada, y lo habían leído menos, pero eso no significaba que la consideración (un tanto ambigua, además) en que lo tenía un puñado de entendidos ou supuestos entendido en poesía careciera de todo fundamento. A veces se dan casos de adivinación social, que suelen entrar en la categoría de profecias autocumplidas. Eso puede deberse a que son tan escasos los escritores bueno que cuando aparece uno, entre mil malos, casi no necesita escribir para que alguien se dé cuenta. Y además está el hecho de que las falsas adivinaciones o las promesas que no se cumplen no se toman en cuenta. (...)
Bem, a história que segue descreve os anos de convívio de Perinola e do filósofo pré-socrático Parménides, que, por não ter tempo ou preparo para escrever, contrata os serviços do jovem promissor para escrever seu livro, por ele. Perinola seria o primeiro ghost writer da história. Parménides entrou para história como o filósofo que incluiu a discussão do ser e o não ser na filosofia ocidental. Questão insolúvel sobre a qual os filósofos se debatem eternamente. Pois, César Aira usa a literatura para dar uma rasteira na filosofia e contar sua própria versão sobre o surgimento desse dilema hamletiano.
quinta-feira, janeiro 10, 2008
Coisas que eu gostaria de ter escrito (ainda o sono e o tempo)
"É muito tarde, minha cara, e ainda assim vou dormir, sem merecer. Bem, dormir mesmo não vou, apenas sonhar. Como ontem, por exemplo, quando no sonho eu andava até uma ponte ou um cais em cuja amurada por acaso havia dois telefones; eu levava os fones ao ouvido e ficava pedindo notícias dos "confins do mar", mas do telefone só vinha o bramir do oceano e um cântico sem palavras, triste, impressionante. Mesmo depois de perceber que nenhuma voz humana conseguiria sobrepor-se a tais ruídos, não desisti e ali fiquei."
Hoje, estou especialmente sonolento, ainda que muito desperto.
O tempo parado de João Gilberto Noll
Entrar numa livraria e roubar o tempo, comprar livros, é roubar dinheiro da família. Ler é roubar ainda mais tempo, ao mesmo tempo que se desfruta do objeto do crime. O tempo da leitura passou a ser criminoso e marginal.
Comecei a ler por Mínimos, múltiplos, comuns. Um livro estranho. Diz a apresentação, de Wagner Carelli:
João Gilberto Noll passou três anos e quatro meses na aplicada disciplina de escrever toda semana duas narrativas completas, e de porte incomum: cada relato estava confinado a um máximo de 130 palavras.
A primeira delas, que abre a seção chamada Gênese e que começa pelo Nada:
Nadas
Tecido PenumbrosoComo posso sofrer porque as coisas pararam? Elas andavam tão estouvadas! Por que não deixá-las dormir agora um pouco? Tudo se aquietou, é noite, o mundo vive pra dentro, cegando-se ao sol do sonho. Preciso um pouco desse conteúdo inóspito, ermo com um quase-nada. Não, não é morte, é uma espécie de lacuna essencial, sem a aparência eterna do mármore ou, por outro lado, sem as inscrições carcomidas. Pode-se respirar também na contravida. Depois então, a gente volta para o velho ritmo; aí já não nos reconheceremos ao espelho explícito, tamanha a qualidade desse tecido penumbroso que provamos.
É melhor ler um livro, as próximas 130 palavras de Noll, talvez. De madrugada, quem sabe, quando as coisas adormecerem. Mas aí, estarei roubando o tempo do sono, um roubo impossível, pois a vítima sempre se derruba o criminoso na ressaca do dia seguinte.
quarta-feira, novembro 28, 2007
O tempo da leitura
Muita gente diz que há muito tempo não lê um livro por falta de tempo. Mas, não é por isso não, é por falta de coisas interessantes para ler. O Harry Potter, por exemplo. Todo mundo leu. Cada novo volume era um tijolo maior e as pessoas os lêem em dias, ou horas, eu inclusive.
Li o último volume em praticamente um dia, certamente em menos de 24 horas. Era uma necessidade, era preciso acabar para me livrar daquilo, da necessidade de ler o que eu já sabia, que Harry não ia morrer e que venceria o Voldemort. Quem é que não sabe o final da maioria das histórias que lemos (ou assistimos no cinema)? Não se trata de chegar ao final, mas de tudo o que acontece até lá. E, se a história for envolvente, o tempo da leitura invade o tempo de tudo o mais. "Mas", alguém pode dizer, "isso é leitura de consumo". Claro que é. E daí? São letras, palavras, frases, parágrafos e páginas, a base de toda a leitura. O tempo, na verdade, é aquele que precisamos para compreender o que lemos. Se a compreensão é direta e sem floreios, a leitura corre. Se precisamos elaborar e refletir, invariavelmente, o tempo diminui.
segunda-feira, novembro 19, 2007
Tradução de livro sobre tradução (Eco)
Bom, JK, brincadeiras a parte, o que você escreveu foi:
" É curiosa essa coisa de tradução de um livro sobre tradução. Gostaria de ter mais opiniões a respeito..."
Acho que a tradução de um livro sobre tradução não é diferente da tradução sobre qualquer outro assunto, a não ser talvez por ser algo que desperte um interesse diferente por parte do tradutor. Eu vou falar mais sobre isso quando terminar de ler o livro do Eco, o que deve acontecer em breve. Existem alguns pontos de interesse sim e vou comentá-los. Essa conversa começou lá na comunidade dos tradutores/intérpretes do Orkut, não teve grandes desdobramentos, mas, obviamente é um tema de especial interesse para quem traduz.
Por ora, estou gostando bastante do texto traduzido. Não conheço a tradutora, Eliana Aguiar, mas conheço a Raffaella, que fez a revisão técnica e sei que ela tem background teórico, acadêmico e prático, para garantir um trabalho bem feito
Afora isso, JK, espero que você esteja com boa saúde e mais vivo, ou viva!, que um peixe na água fria!
domingo, novembro 18, 2007
Fantasma, José Castello
Estou me divertindo muito, é um humor como o rombóite, que não existe mas dói. Creio ser o único romance publicado dele. Em um passeio fantasmagórico por Curitiba, em que a própria cidade tem mais atmosferas do contornos. Espero, ao final, poder escrever mais longamente sobre o livro. Até por que, convivo em meu dia-a-dia com curitibanos típicos
deslocados no Rio de Janeiro. Pessoas por quem tenho profundo afeto, respeito e admiração e a sorte de serem meus sogros.
sábado, novembro 10, 2007
Originalidade
forma artística. A humanidade se renova, as sociedades se modificam, as cabeças acompanham, quer queiram ou não. E o que se escreve, fatalmente reflete isso.
Assim também como o que se lê. Uma mesma obra tem a força de se renovar com os tempos, com novas leituras de novos leitores, ou com novas leituras de um mesmo leitor, ou releitor.
Volta e meia me caem nas mãos livros de autores "novos". Seja para fazer uma resenha, seja para um parecer editorial. Todos são diferentes e originais, o que não quer dizer que sejam necessariamente bons por serem originais. Quer dizer apenas que a renovação é sempre possível. Por isso estamos sempre em busca de novas leituras, de autores novos ou antigos.
Cada leitura é sempre uma primeira vez.
quarta-feira, outubro 24, 2007
Quase a mesma coisa, Umberto Eco
Um livro sobre tradução do Umberto Eco é ótimo para a nossa quase invisível profissão. É importante chamar a atenção para o nosso trabalho. Em geral, quando falam de tradutores e tradução é para botar defeito, raramente se escreve na imprensa algo sério sobre o ofício.
Fora isso, o Eco fala de coisas que, quem traduz, já sabe há muito tempo, mas é bom ver em livro, principalmente livro de Umberto Eco. Por exemplo:
"(...) O tradutor, ao contrário, sempre traduz textos, ou seja, enunciados que aparecem em algum contexto lingüístico ou são proferidos em alguma situação específica." (pág. 49)É importante que as pessoas percebam isso muito bem. Muita gente acha que traduzir resume-se a traduzir palavras, bastando para isso olhar no dicionário. Para os clientes que compram tradução, isso é especialmente importante. Quando dizemos a um cliente que cobramos por palavra, às vezes perguntam coisas do tipo "E as palavras repetidas? Tem diferença de preço para palavras grandes e pequenas?". Aí, é preciso explicar que a palavra (ou lauda, ou página, ou caractere) é apenas uma unidade de cobrança, que na verdade, o trabalho do tradutor é traduzir o texto como um todo.
O tipo de leitura que um tradutor faz do texto é algo para um outro post. Por enquanto, fico por aqui, só para não parecer que o blog estava abandonado de vez.
terça-feira, fevereiro 27, 2007
Cesar Aira
http://oglobo.globo.com/blogs/prosa/post.asp?cod_post=48706
É o primeiro argentino que leio a fugir descaradamente da sombra onipresente de Borges ou do projeto de totalidade do absurdo de Cortázar. Diferente de tudo o que já li.
Nada contra Borges ou Cortázar, muitíssimo pelo contrário. Mas, como o próprio Aira disse em alguma entrevista que achei ao fazer as pesquisas para a resenha, Borges é uma presença tão forte na literatura argentina que é preciso um esforço para se livrar dele.
Acho que isso vale para todo mundo. Ler Borges é uma experiência total de literatura e é muito difícil "livrar-se" de sua influência. Uma influência tão forte, que essa nota era para ser sobre Cesar Aira e acabou sendo sobre Borges! Mas, Cesar Aira, como eu disse na resenha, dá uma gargalhada na cara da literatura. Uma ruptura necessária na mesmice. Recomendo para qualquer escritor iniciante. É a tal fuga dos clichês, a "quebra dos paradigmas" (argh!).
O sonho de Kafka
"Sonho há pouco: com meu pai andando de bonde em Berlim. A atmosfera metropolitana era dada por inúmeras cancelas destribuídas a intervalos regulares, pintadas em duas cores e com as extremidades rombudas e polidas. De resto, tudo era vazio, mas a quantidade dessas concelas era enorme. Chegamos a um portão, descemos do bonde sem perceber, atravessamos o portão. Atrás dele começava uma parede muito ingreme que meu pai foi escalando quase dançando, com tanta leveza que balançava as pernas no ar. Sem dúvida era uma certa desconsideração o fato de ele não me ajudar, pois eu me esforçava muito para subir, ia de quatro e escorregava várias vezes, como se a parede se tornasse ainda mais íngreme sob meu corpo. Também era muito desagradável o fato de a parede estar coberta de excremento humano que ia grudando em mim, aos flocos, sobretudo no peito. Abaixando o rosto eu percebia a sujeira e tentava limpar com a mão. Quando finalmente cheguei no alto, meu pai, vindo do interior do edifício, abraçou-me e cobriu-me de beijos. Ele vestia uma farda imperial da qual eu bem me lembrava, curta, fora de moda, estofada por dentro como um sofá. "Esse Dr. von Leyden! É um homem extraordinário!", exclamava sem cessar. Mas ele não tinha visitado o homem como médico, mas como alguém que vale a pena conhecer. Eu tinha um certo receito de que me obrigassem a também ir até ele, mas não foi o caso. À esquerda atrás de mim vi um homem sentado de costas num aposento que era todo de vidro. Ficou claro que era o secretário do professor e que meu pai na realidade só falara com ele, e não com o professor em pessoa, mas que mesmo assim tinha reconhecido os méritos do professor através do secretário, de modo que realmente podia julgar o professor como se tivesse falado pessoalmente com ele.
Diário, 6 de maio de 1912"
Comprei o livrinho numa das mais autênticas livrarias do Rio de Janeiro, a Leonardo da Vinci, por preciosos R$ 33,00.
Agradeço de coração as palavras amigas dos colegas tradutores, da comunidade orkutiana Tradutores e Intérpretes.
quinta-feira, fevereiro 15, 2007
Kopakabana
Ele passou dois exercícios. Leu a narrativa de um sonho de Kafka para nós e pediu que escrevessemos algo a partir disso. O outro "desafio" era escrever sobre Copacabana sem escrever sobre Copacabana. Ou seja, fizemos uma lista de 50 palavras proibidas, incluindo praia, areia, calçadão, turista, mulher, sol, pivete, camelô, enfim, todas esses clichês infalíveis sobre o Rio e, mais especificamente, sobre Copa. A idéia era fugir dos lugares comuns e tentar falar do bairro de maneira inusitada. Parece que consegui.
Eu juntei as duas coisas e escrevi Kopakabana (http://tinyurl.com/yuxfdd), o "professor" gostou e recomendou a publicação no Rascunho. Está lá, para quem quiser ver.
Faz tempo que o Rio de Janeiro não é mais o Rio de Janeiro. Estamos afundando numa cidade cinzenta, como um cenário de Kafka e estamos nos transformando em insetos, sim. Esse conto mostra como eu, leitor, leio a nossa cidade, cada vez menos tropical. Naturalmente, essa é a leitura que eu faço do meu conto. Mas, no momento em que outra pessoa ler, o conto passa a ser dela e ela (você?) será o autor da sua leitura.
Vou procurar o sonho de Kafka que está por trás da minha história para colocar aqui.
Kafka foi uma leitura importante para mim, acho que ninguém passa incólume por ele. Li umas tantas coisas, faz muito tempo e tudo meio que se mistura. Acho que essa mistura está presente nisso que eu escrevi. Chamam a isso de influência, nesse caso, bem explícita e intencional. Curioso pensar nas influências que não conseguimos identificar. Será que todos os escritores de que gostamos influenciam a gente? Acho que sim, a idéia é essa. Literatura é influência.
quarta-feira, dezembro 20, 2006
Recomendação de leitura e Oficina
Aliás, ele oferecerá uma de suas "Oficinas da Imaginação" na Estação das Letras, agora, no início de janeiro. Eu estarei lá.
terça-feira, novembro 28, 2006
Outras realidades
Andei longe do blog, por outras atividades mais prementes. Outras realidades que exigiam minha presença, não desenvolvi, ainda, o dom da ubiqüidade.
No entanto, cheguei a uma conclusão importante, por mera observação empírica. Outras realidades têm direito à existência, e existem, de fato. Só que por serem outras, existem de maneira diferente da nossa. Uma delas é a realidade das criações artísticas. Um mundo onde as obras se sucedem, como as cidades, os mares e os acidentes geográficos em nosso planeta. Você pode andar por uma praia, de uma ilha, e encontrar Robinson tentanto arrastar uma enorme canoa para o mar. Avance mais um pouco e verá, ao longe, um cavaleiro bem magro, num cavalo derreado, seguidos por um escudeiro roliço. Cuidado com as grandes planícies, pois você pode ser atropelado por hordas de guerreiros de qualquer época, pois esse é um cenário recorrente de todos os períodos e universos. Imagine esse planeta, esse universo das obras literárias. Assim como o nosso, também infinito. Sabemos que jamais o percorreremos por inteiro.
O universo da literatura está em nossas mentes, coletivamente, comunica-se, interage. Numa concepção borgeana, existem lugares das obras escritas, das obras em andamento e do vir a ser. É uma realidade, diferente dessa física, mas que tem existência. Um mundo que se poderia chamar de platônico, por conceitual, mas não me agrada a idéia platônica de cópias imperfeitas. Criações imperfeitas, por incompletas, talvez. Assim como a nossa, essa outra realidade vive em mutação constante, mesmo quando se trata de obras supostamente acabadas. Um ponto final
pode facilmente se transformar em dois pontos, travessão, ou reticências. E o mundo se transforma novamente.
sexta-feira, agosto 25, 2006
A pequena leitora faz poesia sem perceber
A lua não está minguante,
Não está crescente,
Está sorridente! :-)
Carlos, Murilo e Pedro
- Carlos estaria lendo Robinson Crusoé, sentado sob uma mangueira.
- Murilo estaria arremessando pedras para o céu, na esperança de que se incendiassem e virassem novas estrelas.
- Pedro estaria observando-os atentamente, fixando o momento em sua memória, mas sem saber disso, naturalmente.
quarta-feira, agosto 23, 2006
A suprema interrupção
O link para a resenha sobre o Nava é:
http://tinyurl.com/elwtj
Mas vale dar uma boa lida no resto do jornal.
quinta-feira, agosto 17, 2006
O leitor escreve
O
Júlio
Júlio
O
"
Foram.
Rio , 15 de agosto de 2006
sexta-feira, julho 21, 2006
Os prêmios, Julio Cortázar
Abraços,
Daniel
Em busca da maternidade perdida
Resenha publicada no Globo, em 8/7/2006
O
No
A
O
Hilda Lucas, bahiana, radicada