segunda-feira, outubro 31, 2011

Soco ou mão estendida?

Volta e meia, leio nas resenhas literárias que a prosa de fulano é como um soco na boca do estômago. E isso é um elogio.
Eu me sinto nocauteado há muito tempo por uma certa literatura, um cinema, ou uma certa arte. Não me sinto bem. Não acho que o box literário seja um bom caminho de leitura para mim. Não gosto da angústia, muito menos concordo que seja algo a ser buscado. Não concordo que essa náusea existencial seja a condição final do homem. Não quero isso para mim. Estou cansado.

Existem escritores que não nos espancam, e nem por isso lhes falta vigor. Sinto isso em relação ao Ítalo Calvino, ao Herman Hesse, ao José Saramago. Aos cronópios e famas de Julio Cortázar (mas não em relação ao detestável, egoísta e desorientado Horácio Oliveira, incapaz de amar). Alguns escritores, em vez de nos socarem e tripudiarem de nossa miserável condição, acenam para nós de dentro de uma frágil piroga que chegou  à terceira margem do rio. São textos que não chafurdam na escuridão de mistérios que podem simplesmente não existir. Alguns mistérios tolos, que insistimos em criar. Contra os quais insistimos em nos debater com nossa impotência. Ou que, se existem, existem e ponto. Prefiro a luta para não me deixar arrastar pelo impossível, não para mergulhar e me perder nele. Não nego o Horror, mas não o festejo. O que me deixa cada vez mais nauseado é a violência, sempre tão gratuita, mais e mais.

"A gente estava levando agora o Sorôco para a casa dele, de verdade. A gente, com ele ia até aonde ia aquela cantiga."

Existem textos que são como cantigas, que nos acompanham até o fim, que nos levam de volta para casa, de verdade. Não falseiam nossas perdas, não negam a loucura, mas, em vez de socos, nos estendem a mão.

"Profundamente, até o chão, inclinou-se Govinda diante de Sidarta, que se conservava sentado, imóvel, e cujo sorriso chamava à memória do amigo tudo quanto ele amara no curso da sua vida, tudo quanto já se lhe afigurara precioso e sagrado."

Existem textos que nos libertam.

"Quais imprevistas idades de ouro prepara, você, malgovernado, você, precursor de tesouros que custam muito caro, você, meu reino a ser conquistado, futuro..."

E neste ponto, consigo encontrar algum sentido na literatura.

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