sexta-feira, julho 15, 2011

Banquete dos Mendigos: "NO PRINCÍPIO ERA O VERBO: SOBRE A IMPORTÂNCIA DA PRIMEIRA FRASE..."

"(...)Numa época de leitores impacientes, a primeira frase é quase uma cantada. Seu poder de sedução tem de ser forte, para que o leitor siga adiante."

Assim escreve o irmão Adriano no seu blog.

As primeiras frases que me vêm à cabeça?

"Encontraria a la Maga?"
E
"In a hole in the ground, there lived a hobbit."

Talvez as únicas que consegui memorizar, e tão curtinhas... E são de livros enormes, imensos, titânicos. E começam de maneira tão singela. Num deles, o amargo Oliveira, noutro, o puro e obstinado Frodo. Quem diria. De universos tão distantes, foram se encontrar nas minhas mãos leitoras. Frodo virou personagem de cinema. Oliveira, desconfio, poderia ter sido personagem de um filme da Nouvelle Vague, sei lá. Agora, acho que será cada vez mais esquecido. A culpa é dele mesmo, pois, no final, desencontrou-se da Maga, desencontrou-se de si, enfiou-se num barril de bosta onde resolveu se afogar. Sucumbiu a si mesmo. Frodo salvou-se. Não totalmente, mas sobreviveu a si mesmo.

E a frase que citei do Adriano, citei porque reforça essa minha impressão de que hoje os livros entram numa competição de vida ou morte com os outros meios, basicamente, os audiovisuais e a leitura expressa da Internet. Se não pegar o leitor de cara e "puxá-lo pelo nariz", como escreveu Cortázar, pode considerar o leitor perdido. A passagem do livro de papel para o digital tem bastante a ver com essa história. Algo como "se juntar ao inimigo". Mas não, não considero o livro digital um inimigo, a literatura digital sim, ainda é nova demais para merecer o respeito que um dia ainda poderá conquistar, transformada em alguma outra coisa.
Minha dificuldade não costuma ser com a primeira frase, mas com a última. Se não tenho um final, sou incapaz de iniciar o que quer que seja. Preciso de conclusões. Não gosto de mistérios que não se revelam. Não me importo nem um pouco de saber do final de um livro, ou filme, antes mesmo de conhecer o começo. O suspense persiste, pois sempre é preciso descobrir como se chegou até ali. Que o diga Homero, que já sabia disso desde o princípio, com sua história que começa in media res, como ensinava o Junito Brandão.

3 comentários:

Unknown disse...

tanta coisa pra comentar, mas minha mente fixou na ideia de literatura digital e todo o debate em torno a ela [acho que é porque estou lendo "a memória vegetal", do umberto eco]. Ano passado ganhei um Kindle e, sei lá, não me encantei. ta encostado. tenho uma certa tara pelo objeto livro. uma coisa muito sensorial mesmo. ainda não terminei um livro sequer por meio de leitura digital. implicância?

quanto aos inícios e finais, vc foi perfeito ao citar homero. reforço com um conterrâneo meu, o famoso joão rosa, que dizia: "o real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia...”
abraço

O Leitor disse...

Não tenho preconceito algum quanto aos meios. Li Memorial de Aires num Palm Pilot, andando de ônibus e metrô. Só não tenho um leitor digital por uma questão de prioridades. ;)

Carolina Alfaro de Carvalho disse...

Estou lendo agora "La fiesta del Chivo", de Vargas Llosa. Estava enfiado em uma estante, minha mãe me deu e eu tinha esquecido. Aí ela me pediu de volta, para ler. Tirei o livro da estante e fiquei curiosa para saber de que se tratava. Abri a primeira página. A primeira frase, na íntegra, é:

"Urania."

Não consegui mais parar de ler.

Aliás, este livro é uma aula de como se escreve um livro que prende. Até agora não descobri nem o que estou achando tão fascinante, mas simplesmente não dá para fechar o livro.

Recomendo!

:-)