José Saramago responde a Juan Arias:
"— Nunca lhe aconteceu de parar e pensar que afirmou algo que podia ser o contrário?
—Digo-o de outra forma: há que se parar e perguntar-se o que se está a dizer. Se o fizermos, veremos que não temos outro remédio se não analisar o que se diz, e então percebemos que às vezes dizemos coisas que não têm o menor sentido.
— Ou que às vezes o dizemos porque outros o disseram, sem refletir sobre isso.
—É, e repetimos coisas que de uma forma passiva se instilaram dentro de nós e nos impregnaram. Estou a dizer coisas que não saõ minhas. Certo, mas, na verdade, que coisas são minhas? Por isso digo que somos feitos de papel. O que é verdadeiramente nosso? Muito pouco, quase nada. Talvez todos sejamos os outros.
—É o que dizia Leonardo Sciascia, nosso querido amigo e escritor siciliano, já falecido: no fundo nunca se escreve nada de novo, mas se reescreve.
— O que não sabemos é desde quando. Realmente, das frases dos literatos se aprende muito. Diante dessa frase de Sciascia, um escritor que sempre admirei muitíssimo, surge-nos a questão: e desde quando nos reescrevemos? Porque deve ter havido um momento em que tudo era novo, e depois disso nada mais é novo, estamos a repetir tudo. Nunca sabemos quando o novo principia."
in: José Saramago: o amor possível. Juan Arias. Ed. Manati.
E aí, me pergunto. Quando e por que escrever, em lugar de ler desenfreadamente? Ou mesmo falar, em lugar de ouvir atentamente? Quem sabe se nos calarmos não consigamos aprender alguma coisa de fato e paremos de nos repetir?
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Um comentário:
É como disse lá no Twitter: gosto muito do que o Saramago tem a dizer.
Gostei também da sua observação...
Apesar de escrever bastante (passei dos 1700 posts em 7 anos de blog) acredito que também sei me calar e ouvir. Além disso, antes de começar a escrever eu li muito.
Apesar disso tudo... Provavlmente eu devesse falar e escrever menos, mas é que há um outro lado nessa história toda.
O que mais se faz é repetir. As próprias palavras do Saramago que vc escolheu já foram ditas por outros. Ele também reescreveu ;-)
Creio que gente como você (e eu) precisam falar sim porque a gente tem um certo impulso de desafiar chavões e lugares comuns.
Não é coincidência nós dois gostarmos de Philip Pullman ;-) ele também é um transgressor, assim como o Nilton Bonder (rabino autor de A Alma Imoral).
Bom, seja como for seu post foi ótimo ou não me teria feito escrever tantos lugares comuns em vez de ficar caladinho lendo! hahaha!!! ;-)
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