Ia dizer inesquecíveis, mas podem me acusar de plágio ou falta de originalidade, a causa do Sérgio Rodrigues e seu Todoprosa. Mas, é verdade, sempre apreciei bons começos, praticamente definem o andamento de todo o resto da leitura.
Dois deles ficaram gravados na memória, o que é difícil, raríssimo, uma vez que minha memória. Bem.
“Encontraria la Maga?”, de O jogo da amarelinha, e “In a whole in the ground, there lived a hobbit”, de O hobbit.
Quando fui a Paris com a esposa, pedi que ela esperasse de um lado da Pont Neuf, eu iria até o outro, depois voltaria e nos encontraríamos no meio. Ela nada entendeu, a minha Maga, que quase nada tem de cronópio e muito de fama. Ah, os papéis que atribuímos a nossas mulheres sem que elas nada saibam...
Pode parecer esdrúxulo misturar Cortazar e Tolkien. Para mim, não. Ambos são, ao fim e ao cabo, literatura de viagem. Adoro Tolkien, adoro suas intermináveis descrições das paisagens da Terra Média, um mundo com uma proporção de realidade que chega ser difícil acreditar que não é de carne e osso, pau e pedra e pó, e nunca mais. E esse começo de O hobbit, bem era um ser minúsculo que um dia botou os pés para fora de seu buraquinho no chão e se perdeu, depois se achou, mas aí já estava irremediavelmente perdido. Horácio Oliveira também era um ser minúsculo, ainda assim nunca coube em seu buraquinho original e teve que sair. Não voltou mais. Quando voltou, não se achou. Irremediavelmente estrangeiro de si. Lamentavelmente, perdeu-se de sua Maga também. Talvez, Rayuella pudesse ter começado assim: "Perderia la Maga?". Sim, perderia. E isso me causa uma profunda tristeza, pois sei bem a importância de encontrarmos a nossa Maga e a mantermos do nosso lado. Por menos Maga que seja. "Matem o cachorro!", gritava Oliveira no final. É, matem o cachorro.